29.1.03

Brasil, "ame-o ou deixe-o" 2003

Por Paulo Diniz

De repente, não mais do que de repente, o mesmo Brasil em que "milhões passam fome", segundo os apóstolos do apocalipse social e da intervenção estatal gostam de dizer aos quatro ventos para justificar seus projetos intervencionistas, é elevado pela mídia chapa-branca ao patamar de "superpotência" mundial.Pois não é possível chegar à outra conclusão após uma breve olhada nos noticiários internacionais da maior parte dos órgãos de imprensa nacionais.

O noticiário do "GloboNews" da última semana (creio que da quarta-feira, 22/01) afirmava que a "atração" no Fórum Econômico Mundial seria o Presidente Lula. Como prova da afirmação, a mídia chapa-branca apresentava manchetes de jornais comunistas ou de políticos socialistas, saudando a visita do presidente brasileiro à Europa como se isso fosse sinal de que Lula é mesmo um importante chefe de Estado.Obviamente que Lula não poderia deixar de ir visitar o "patrão" dos esquerdistas mundiais, o sr. Soros, além de representantes de outras entidades pródigas em patrocinar os comunistas, socialistas e terroristas internacionais, com gordas verbas e apoio moral, todos devidamente empenhados na criação do "Estado Global".

Claro exemplo disso é a proposta de Lula para a criação de um "fundo internacional para apoiar os países em desenvolvimento na luta contra a fome", tudo como manda o figurino dos esquerdistas norte-americanos e europeus, interessados em acabar com ideais de liberdade e desenvolvimento baseados na livre iniciativa e democracia, e substituí-los por panacéias do tipo "democracia participativa", "pacto mundial", e outros expedientes sofísticos que escondem apenas e tão somente o totalitarismo coletivista.Mas além da presença do "popstar" do Planalto no Fórum Econômico Mundial, também não faltou parcialidade na cobertura do tal "Fórum Social Mundial", um evento exótico, para dizer o mínimo, e que é apresentado como se realmente significasse algo de construtivo e palpável para o mundo. Em ambos os casos, eventos de duvidosa significância no cenário internacional, são explorados ao máximo pela imprensa socialista/oportunista para dar a impressão de que o Brasil tornou-se um país de ponta na diplomacia internacional.

O mesmo também ocorre com o episódio absurdo que envolve o arrogante e desenvolto assessor para assuntos internacionais ligado ao PT, que atuando como uma "eminência parda" nas relações internacionais do país compromete a diplomacia brasileira, situação que é transformada pela mídia socialista numa "jogada de mestre", enquanto o referido cidadão é louvado como se fosse um autêntico "Bismarck" tupiniquim.O ufanismo desavergonhado, sem bases reais, chega ao cúmulo de uma revista semanal, a IstoÉ, estampar na capa uma manchete sobre o redivivo "nacionalismo" dos brasileiros. Se no tempo dos militares, ou mesmo durante o governo FHC, uma tal manchete fosse publicada, é possível imaginar a quantidade de críticas e análises sociológicas baratas que os inúmeros esquerdistas da mídia já teriam feito sobre ela. Mas como é o "governo popular", tudo bem.

A revista Veja, para não ficar atrás, saiu-se com análises sobre a suposta capacidade do sr. Lula em unir o "social ao econômico", sendo que Lula seria o autêntico representante da chamada "terceira via".Mas esse ufanismo barato, que nada mais é do que puro fanatismo ideológico, mesclado a uma boa dose de oportunismo, não resiste a uma análise séria, por mais simples que seja.Só porque os petistas e socialistas da mídia querem é que Lula realmente representa alguma coisa no cenário internacional para justificar afirmações esdrúxulas que o apontam como o "destaque internacional do momento", "líder de nível mundial" etc . O que é que o governo Lula tem para apresentar, afinal, que justifique afirmações como essas? Uma economia periclitante, cada vez mais controlada pelo Estado? A manutenção do "balcão de negócios" no Congresso Nacional, em busca de poder político? Enfim, o PT e Lula não possuem nada, rigorosamente nada, para mostrar, a não ser as credenciais ideológicas socialistas de sempre, o que lhes garante a inimputabilidade perante a mídia.Certamente que para os esquerdistas da mídia nacional e internacional a realização do circo de horrores em Porto Alegre credencia o governo do PT a se exibir como uma "notável" administração, mas somente com muito boa fé, típica dos idiotas, ou comprometimento ideológico, é que se pode enxergar credibilidade numa reunião que beira o absolutamente bizarro como essa.

Enfim, uma conferência de lunáticos esquerdistas acontecendo em terras brasileiras, somada à presença na presidência da República de um político esquerdista medíocre, é o que bastou para a mídia promover o Brasil de um país "comum" até 1o. de janeiro, para "potência" de alcance global.Citando as palavras de um ilustre economista, "até quando vamos ficar batendo palmas para bêbados dançarem", nessa fraude que a mídia brasileira está se convertendo?

24.1.03

Os Óculos do Presidente

Por Maria Lucia Barbosa

Um objeto ronda a mídia brasileira: os óculos do presidente da República. Volta e meia eles aparecem em alguma notícia. Assim, no dia 22 deste janeiro de muito calor e confusões ministeriais, li novamente sobre os benditos óculos no austero e consistente O Estado de S. Paulo.

A matéria, encimada pelo retrato do presidente prestes a colocar os óculos, versava sobre o ministro dos Transportes, Anderson Adauto, supostamente envolvido no desvio de R$ 4 milhões da prefeitura de Iturama (MG). No texto apareciam defesas veementes do ministro e uma lacônica informação do porta-voz da presidência (que cá entre nós mais parece colunista social do que porta-voz): "Não está na pauta do presidente a substituição de ministérios". No final da dita matéria, um subtítulo, "óculos": "Nas audiências de ontem o presidente Lula apareceu com um novo modelo de óculos, também de titânio, para a correção da chamada ‘vista cansada’. O modelo de ontem, um dos três que ele testou nos últimos dias, foi escolhido para o uso diário do presidente". Fiquei pensando o que teriam a ver os óculos de titânio com o suposto caso de corrupção.

As suspeitas foram despertadas quando o Correio Braziliense (14/01/03) publicou o fac-simile de uma carta do então deputado estadual Anderson Adauto à CPA Consultoria de Planejamento e Assessoria. Uma possível interpretação era a de que a empresa teria sido utilizada para desviar os R$ 4 milhões da prefeitura de Iturama. A CPA pertence a Sérgio José de Souza, nomeado pelo ministro Adauto para assessorá-lo no Ministério dos Transportes, mas que pediu demissão depois da publicação das denúncias sobre o desvio de verbas em Iturama. No dia 4 deste, o ministro-chefe da Controladoria Geral da União, Waldir Pires, disse que não investigaria a suposta participação de Anderson Adauto no desvio, porque se houve desvio, não foi de recursos federais, por isso o caso fugia à competência da Controladoria. Fiquei a me perguntar se existe algum meio de controlar esse tipo de coisa nos âmbitos estadual e municipal ou se os "pecados" fora da esfera federal são todos perdoados.

Anderson Adauto também presidiu a Assembléia Legislativa de Minas Gerais (1999-2000) e participou de pelo menos 21 decisões inconstitucionais, entre elas as que contribuíram para elevar os salários dos deputados para cerca de R$ 60 mil reais. Eram os famosos "decretos secretos", que incluíam verbas generosas ate para o paletó, e cujas deliberações não passavam pelo plenário.

Enquanto a imprensa entretinha o respeitável público com caso do ministro Adauto, aliás rapidamente absolvido pela Justiça mineira e pelo presidente Lula, o Copom (Comitê de Política Monetária do Banco Central), aumentou os juros. A taxa Selic passou de 25% para 25,5%. Quando não usava óculos, Lula dizia que "baixar os juros era só uma questão de vontade política". Com os óculos, virou uma questão técnica. Conforme pontificava o saudoso personagem Odorico Paraguaçu, "mudam-se as circunstâncias, mudam-se os compromissos, desde os tempos em que os romanos usavam saiotes e sandálias".

Enquanto isso, através do jogo desvairado do toma-lá, dá-cá, tão tradicional no Congresso, o PT prepara-se para ser partido dominante elegendo as presidências das duas casas. O PT no poder não ter problemas com a votação das reformas que não deixou que fossem votadas durante os 8 anos de FHC, especialmente a da Previdência e a Tributária.

Tudo isso só pode ter uma explicação: Deram os óculos de Fernando Henrique para Lula, pois é através da visão do ex-presidente que o atual governo vai tentando encaminhar os destinos da Nação. Nem o Serra faria melhor.


23.1.03

Que liberdade de expressão?

Por Evandro Ferreira, do Outonos.com

Quando eu saio por aí dizendo que estou cansado dessa conversa de cidadania, as pessoas acham que eu estou brincando, que isso é só um jeito de falar etc etc. Mas não é. I really mean what I say.

Eu não penso que a solução para os males do Brasil está no combate à corrupção e na transformação dos indivíduos em autômatos que jogam o lixo no lugar certo e denunciam como discriminação racial quem chama afro-brasileiro de negro. E também não acredito no crescimento da influência da ONU sobre o mundo, rumo a um quase governo mundial, supostamente capaz de acabar com as guerras e manter a paz perpétua. Nisso estou com Platão. Como disseram Mortimer Adler e Seymour Cain no primeiro volume de The Great Ideas Program, “ainda que A República seja comumente considerada uma utopia, a paz perpétua não era um dos ideais utópicos de Platão”. Eu não sou a favor da guerra, mas também não acredito que, para evitá-la, tudo se justifique. Não acredito na força absoluta do consenso. Se dois países entram em guerra, acredito que um possa estar certo e outro errado, pois não sou relativista. Quem é relativista acaba acreditando que o consenso é mais importante que a razão. Em certos casos, buscar uma solução pacífica é como fazer um acordo com o sujeito que estuprou e assassinou sua esposa, dando-se a ele várias regalias em troca da promessa de que ele não fará o mesmo com sua filha. É simplesmente ridículo. Só o Ocidente cai nessa de negociação ad infinitum, o que aliás é o ponto de sutentação do terrorismo e da guerrilha. Vejam o Putin no caso do Teatro de Moscou e entenderão o que estou dizendo.

Mas de que serve essa digressão? Serve para mostrar que o preço do consenso absoluto é o fim da liberdade de expressão, ao menos no sentido pleno desta. Li recentemente (não me lembro onde) uma boa definição de consenso: “é o ato de não se levar a sério nenhuma das opiniões contrastantes”. Eu não absolutizaria tanto, pois acho que um certo grau de consenso é possível e necessário. Mas, quando se acredita em certo e errado, começa-se a perceber que até a palavra “opinião” é uma armadilha. Tudo hoje é opinião. Não há mais argumentos bem fundamentados. E se não há tal coisa, não há verdade. Muitas pessoas levam suas vidas inteiras estudando e batalhando para fundamentar seus raciocínios, tudo para participarem de debates e terem seus argumentos considerados com o mesmo peso que os de um estudante secundarista, pois tudo não passa de opinião.

Liberdade de expressão não é apenas poder dizer tudo que se pensa. De nada adianta dizer tudo que se pensa, se ninguém leva a sério o que os outros dizem. O mundo se transforma então num grande palco, onde cada um entra e diz alguma coisa, e então o diretor diz: “o próximo, por favor”!

E é isso que acontece hoje em dia. Você pode dizer tudo que pensa, mas tem que ser “cidadão”. Mas e se eu não concordar com a própria idéia de cidadania? Quero dizer, como pode existir liberdade de expressão, se o pressuposto comum for obrigatório? Então, o que acontece é que as pessoas se fazem de desentendidas. A hipocrisia vira regra. Defende-se a cidadania como valor indiscutível e escuta-se o que os seus opositores têm a dizer, mas sem levá-los a sério. É o desdém a priori com ares de respeito democrático.

E apareceu a palavra-chave. Democrático, democracia. A liberdade de expressão hoje está condicionada pelo regime de governo. No Brasil, mesmo os que se dizem liberais recorrem, em última instância, ao velho argumento de que determinada coisa está “ameaçando a democracia”. Diante disso eu fico pensando sempre em quantas coisas nos ameaçam sem que para isso precisem ameaçar a democracia. A principal característica do liberal brasileiro, que gosto de chamar de “liberal insosso”, é a de que seu maior argumento em defesa da liberdade de expressão é o fato de que estamos em um regime democrático. Cito novamente Mortimer Adler e Seymour Cain, que relembram os ensinamentos de Platão:

O pensar Moderno está tão acostumado a ver a censura como um mal, que chega a ser surpreendente que Platão nem mesmo considere a possibilidade de que possa haver argumentos contra ela. Certamente que argumentos contra a censura baseados na conveniência de uma forma democrática de governo não têm cartaz com Platão. Seria interessante, portanto, que se tentasse encontrar algumas razões contra a censura que não se fundassem em uma forma determinada de governo.

Por que é tão importante que se encontrem razões, por assim dizer, apolíticas para a liberdade de expressão? Pelo simples fato de que se a censura for repudiada em função da democracia, pode haver - e, acredite, HÁ - ocasiões em que o oposto se torna verdadeiro, e a censura pode passar a ser defendida como forma de se manter a democracia. Não estou brincando e nem me referindo necessariamente à ditadura militar. Lembro-me bem de que Antonio Candido disse recentemente que estava disposto a aceitar uma diminuição da liberdade de expressão, se for pelo bem da sociedade. Essa é uma velha história: perder temporariamente a liberdade, em troca de uma posterior “democracia” mais justa. O termo vem entre aspas porque são infinitos os significados que se dá hoje a essa palavrinha. Eles vão desde anarquia capitalista até comunismo.

E se o argumento da democracia (ou de qualquer outra forma de governo) serve tanto para a censura quanto para a liberdade de expressão, o mesmo se pode dizer da cidadania e da tal “construção do consenso”, os quais, em última instância, são subordinados à democracia. Quando Lula nos diz que, para haver um consenso, é preciso que haja opiniões diversas, o que ele está fazendo não é nada além de brincar com as palavras. A rigor ele está certo. Mas quem disse que a política é uma ciência rigorosa? Para todos os efeitos, se há apenas uma opinião (a de que a cidadania é uma beleza, por exemplo), ela se torna um consenso por WO (lembra-se das aulas de educacão física?), ou seja, por absoluta falta de concorrentes. Filosoficamente (ou logicamente) falando, ela não será um consenso, será uma unanimidade. Só que a unanimidade - na política - desempenha o mesmo papel do consenso, a saber, o de regra universal de conduta.

A política, portanto, funciona tanto com várias opiniões (democracia) quanto com apenas uma (totalitarismo). E os demais significados da palavra democracia é que garantem sua ineficácia como argumento em prol da liberdade de expressão. Seria preciso então que se definisse o que é democacia. E, conforme a definição que se desse, esse regime passaria a ser válido apenas se convivesse com a liberdade de expressão. Mas aí já não teríamos mais a liberdade de definir o que é democracia, pois ela já estaria definida a priori. Como se vê, a coisa se torna circular, impossibilitando-se o encontro de uma solução. E a democracia pode até ser totalitarismo e continuar, para todos os efeitos, uma democracia. Para isso basta que os escravos acreditem que são livres, o que hoje não é tarefa difícil se se considerarem os inúmeros mecanismos de dominaçãom das consciências, desde a programação neurolinguística pura e simples até os slogans políticos, como “a esperança venceu o medo”.

Parece-me que o problema principal por que passamos hoje no Brasil é o deslumbramento com a idéia de cidadania. Os veículos de imprensa que têm alcance nacional ainda disfarçam, mas os demais já a acolheram como uma regra inviolável. Basta que se leia o Correio Braziliense ou o Estado de Minas para que se perceba que a mais pura e direta campanha pró-cidadania já se confunde com jornalismo imparcial. Aqui em Belo Horizonte, até os seminários de jornalismo são promovidos pela prefeitura. Quase todos os jornalistas se tornaram praticamente funcionários públicos, e gastam todo o seu tempo discutindo políticas públicas para esse ou aquele setor, como se fossem membros de seus sindicatos. Quando o assunto é educação, discute-se de que maneira esta promoverá a cidadania, que é o objetivo último e quase único. Formou-se uma dobradinha entre universidade, imprensa e poder público, que garante a imunidade crítica dessas três instituições.

Para o jornalista brasileiro padrão, bem como para uma boa parte dos professores universitários, a vida é basicamente um problema de políticas públicas. E a função principal da educação para eles é ensinar às crianças e aos jovens esse corolário. Ética e cidadania há muito se tornaram sinônimos, ilustrando perfeitamente o que diz Olavo de Carvalho em O futuro do pensamento brasileiro (negrito meu):

Por que acontece que, à medida que a opinião da classe letrada se mundializa graças à informatização e à rede de telecomunicações, nessa mesma medida ela perde o senso crítico e a acuidade intelectual ao ponto de confundir normas políticas concretas com princípios éticos universais? [pg. 128]

Não consigo encontrar exemplo melhor no cenário brasileiro do que este da cidadania - que é uma norma política concreta - ser elevada a princípio ético. No plano mundial, tanto os liberais insossos quanto os neo-esquerdistas deslumbrados encontram esse outro exemplo que é o da elevação da democracia a princípio ético universal, através do “Relatório da Comissão Mundial da Cultura e do Desenvolvimento”. Este documento oficial da ONU citado por Olavo de Carvalho no referido livro estabelece os três princípios a partir dos quais deverá ser construída a ética universal: desenvolvimento, democracia e igualdade dos sexos. Os três são políticos, tragicamente confundidos com princípios filosóficos.

Não me sinto capaz de listar e analisar aqui quais são os argumentos apolíticos contra a censura. Contento-me com essa minha tentativa de mostrar que só eles são legítimos e limito-me a deixar essas reflexões, que não são de pouca monta. Eu não troco o meu direito de falar e ser ouvido pela promessa de se “mudar tudo isso que está aí”. Muitos, como Antonio Candido, já estão dispostos a isso. E eu não creio que eles avisarão quando chegar a hora da troca, mesmo porque cada gesto deles já é um pequeno aviso, para quem tem olhos de ver.


20.1.03

O "jornalismo cidadão" completa 5 anos*

Por Paulo Leite, de Washington, DC

A semana que passou marcou o quinto aniversário de um evento que mudou a relação de forças na mídia norte-americana. No dia 17 de janeiro de 1998, um então obscuro site chamado "The Drudge Report" revelou que o presidente Bill Clinton havia se envolvido sexualmente com uma estagiária de 21 anos de idade. O nome Monica Lewinsky estava prestes a se tornar domínio público. O nome Matt Drudge também. E a mídia, esta nunca mais seria a mesma.

A chamada "grande imprensa" tentou o quanto pôde ignorar a história. Mas no dia 21 de janeiro, não houve mais jeito: o Washington Post publicou sua primeira história sobre o "affair" Lewinsky. Até hoje, a mídia estabelecida considera essa data como o início do caso Lewinsky, que culminou no impeachment de Bill Clinton. Mas o ex-presidente sabe muito bem que tudo começou com o "Drudge Report": assim que a história foi publicada na Internet, Clinton telefonou para sua secretária Betty Currie, para combinar os detalhes da história que os dois iriam contar ao mundo. Esse telefonema, mais tarde, resultou num indiciamento por obstrução da justiça.

O mais curioso é que o artigo original de Drudge contava justamente que a revista Newsweek (de propriedade do Washington Post) havia vetado a publicação de uma reportagem de Michael Isikoff sobre Clinton e a estagiária, poucas horas antes da revista começar a ser impressa. Quem consultou o Drudge Report pôde ler que "a estagiária era visitante frequente de um pequeno estúdio adjacente ao Salão Oval da Casa Branca, onde ela diz ter prestado favores sexuais ao presidente. Rumores sobre o relacionamento começaram a correr pelos escritórios da Casa Branca e a estagiária acabou sendo transferida para o Pentágono, onde trabalhou até o mês passado."

Mais: "a jovem estagiária escreveu longas cartas de amor ao presidente Clinton, que ela entregava por uma empresa de mensageiros. Ela sempre visitava a Casa Branca depois da meia-noite. Na portaria, ela dizia estar visitando uma secretária chamada Betty Currie, 57."

E o detalhe comprometedor: "O DRUDGE REPORT descobriu a existência de fitas com conversas íntimas entre Clinton e a estagiária."

E isso foi só na primeira matéria publicada no site. Nas 72 horas em que teve a exclusividade do caso, Drudge publicou dezenas de matérias, detalhando, por exemplo,a existência de um vestido azul manchado de sêmen, e insinuando certas brincadeiras sexuais praticadas com a ajuda de um charuto cubano.

Os defensores do presidente Democrata (aproximadamente 98% da imprensa e 100% da intelligentsia norte-americana) atacaram Matt Drudge por todos os lados e de todas as formas. Mas cada rodada de revelações nos jornais e estações de rádio e TV só servia para confirmar que seus artigos estavam certos. Clintou acabou sendo impedido, embora não forçado a abandonar o cargo. Processado por perjúrio e obstrução da justiça, acabou perdendo sua licença de advogado.

Em seu livro "Drudge Manifesto", Matt Drudge conta que o "Drudge Report" nasceu mais do que modestamente no inverno de 1994, num pequeno computador Packard-Bell, presente de seu pai. Começou a vida como notas enviadas por e-mail para um punhado de leitores, que foram se multiplicando exponencialmente. Recentemente, o site ultrapassou a marca de um bilhão de visitas por ano, e continua sendo consultado diariamente por milhões de leitores. Não é incomum ouvir no rádio frases como "Drudge está destacando no seu site que..." ou "eu estava visitando o Drudge Report e li que..."

Nada mal para alguém que, como era de se esperar, não recebe um grama de respeito dos jornalistas tradicionais. Matt Drudge já foi acusado de aventureiro, irresponsável, fraude, enganador e outros insultos variados. Pouco depois de ter revelado o caso Lewinsky, ele foi convidado a aparecer no Clube Nacional de Imprensa, em Washington, onde teve que escutar críticas de uma coleção de jornalistas de nariz empinado, que buscaram de todas as maneiras ridicularizar seu web site e suas habilidades jornalísticas. Fosse no Brasil, provavelmente o teriam acusado de não ter diploma.

Goste ou não a imprensa paleolítica, Matt Drudge abriu caminho para inúmeros sites noticiosos na Internet, onde hoje em dia uma grande porcentagem dos norte-americanos recebe sua dose diária de notícias. Mais que isso, boa parte dessas pessoas responde às notícias, critica, comenta, opina, tudo em tempo real. É o que Drudge chama de "jornalismo cidadão". Os jornalistas profissionais já não são os donos absolutos da verdade. Vai ser duro para muita gente se acostumar.

*Artigo escrito para o Midia Sem Máscara


17.1.03

Islam e Preconceito

Por Omar Nasser*

“As pessoas são inimigas do que não conhecem”

Imam Ali bin Abi Talib (a.s.)**


Em conversas com amigos, lendo jornais ou assistindo TV, percebo um tom unívoco na abordagem do Islam (prefiro esta grafia ao aportuguesado Islã. Numa próxima oportunidade explicarei o porquê). Via de regra, os termos “islâmico” e “islamismo” estão ligados a fatos violentos, à ação extrema de grupos que se dizem “muçulmanos”.

Minha preocupação – e crítica – nasce da constatação de que a ação violenta de alguns grupos tem sido tomada no Ocidente, via de regra, como medida do Islam in totum. As pessoas em geral – e muitos intelectuais, em particular – adotam as imagens e palavras editadas dos jornais e telejornais como o corpo pronto e acabado da fé muçulmana. Sem se dar ao trabalho de buscar outras fontes de conhecimento, aceitam passivamente a idéia de que Islam = intolerância.

Para demonstrar o erro de tal inferência, faço uma comparação. Imaginemos que as imagens do Ocidente Cristão que chegam no Mundo Islâmico passem, antes, por um filtro. E que nele fiquem retidos todos os aspectos que poderíamos qualificar de “positivos”: o progresso tecnológico, as redes de solidariedade que se multiplicam em países como o Brasil, os momentos de concentração para o culto nas igrejas e templos evangélicos, a vida tranqüila nos finais de semana nos parques.

Imaginemos que a audiência islâmica receba, apenas, imagens e informações sobre as ações extremas do católico Exército Republicano Irlandês, explodindo bombas em supermercados e lojas do Reino Unido. Ou, sobre os atentados à bomba perpetrados pelo ETA, na católica Espanha. Ou, ainda, sobre a ação truculenta da Máfia na Itália, nação que abriga o Estado do Vaticano e que foi ela mesma, durante séculos, os Estados da Igreja.

Imaginemos que no Mundo Islâmico cheguem, apenas, imagens, sons e textos sobre grupos cristãos radicais como o do Pastor (de triste memória) Jim Jones, que induziu milhares de seguidores a tomar veneno, nas selvas das Guianas, nos anos 70, “em nome de Deus”. Ou sobre a seita formada em torno de um lunático chamado David Koresh que, dizendo-se uma encarnação de Jesus (que a paz esteja com ele), queimou a si e a dezenas de crentes na cidade de Waco, nos Estados Unidos, em 1993.

Atrelar o Islam à violência é tão absurdo quanto julgar o Cristianismo a partir das ações terroristas do IRA ou dos dogmas Davidianos. No mínimo, o que se vai obter com esta prática é alimentar o íncubo da ignorância e, no limite, nutrir o ogro do preconceito. Pois, preconceito é exatamente isto: formar um juízo de valor sem conhecer o objeto julgado.

Religião nenhuma nasceu para fomentar o ódio. Religião nenhuma defende a morte, a guerra de ataque, a ganância. Pelo contrário. A mensagem religiosa é, sempre, de fraternidade, de incitação à prática do bem, da compreensão. Não pode ser confundida com o uso deletério que pessoas ou grupos fazem dela para atingir propósitos outros, sejam de cunho político ou financeiro.

Todas as religiões pregam a busca da paz, a atenção ao próximo, em especial aos necessitados, e a tolerância. Entre outros, estes são aspectos sobre os quais o Islam, alicerçado em 1.400 anos de história, tem muito a ensinar. O versículo 15 da sura 42 do Al’Quran (intitulada A Consulta) é uma bela e clara exortação ao entendimento. Diz nela Deus Altíssimo ao profeta Muhammad (s.a.a.a.s)***, referindo-se “Aos que herdaram o Livro” – cristãos e judeus: “Convoca-os, pois, e persevera na senda da retidão, como te foi ordenado. E não sigas suas paixões. E dize: ‘Creio em todos os Livros que Deus fez descer (...). Deus é nosso Senhor e vosso Senhor. Temos nossas obras e tendes vossas obras. Que não haja discussões entre nós. Deus nos unificará. É para ele que todos caminhamos’”.

Omar Nasser é jornalista e vive em Curitiba

** O Imam Ali (a.s) foi o quarto califa a comandar a comunidade islâmica após o falecimento do Profeta Muhammad (s.a.a.a.s), sendo dele seu primo e genro.

*** A sigla “a.s” representa as expressões árabes “a’leihi salam”, “a’leihem salam” ou “a’leiha salam”, que significam, respectivamente “a paz esteja com ele”, “com eles” ou “com ela”; a sigla “s.a.a.a.s” representa a expressão “salla allahu a’leihi ua alihi ua sallam”, que significa “Deus saudou a ele e à sua família e os abençoou”. É praxe empregá-las quando citamos os nomes dos profetas.


15.1.03

Do "Amor Social"

Por Paulo Panzoldo

No Brasil, a confusão existente entre o Público e o Privado tem nos afastado das instituições e, pior, de nossos “Próximos”. É que o excesso de governo tem roubado nossa privacidade sem que possamos sequer reclamar, sem que passemos antes por alguma repartição pública.

Como paulistano, meu índice de possibilidade de indignação é sensivelmente maior que o de um morador de um povoado do sertão nordestino. Não pelo possível desgoverno, pela omissão ou corrupção das autoridades municipais, estaduais ou federais, pelo contrário, pelo excesso de governo. Um paulistano como eu, que deve, não nega, e deseja pagar um imposto, pode levar cerca de trinta dias para alcançar seu objetivo de “ser cidadão” e estar quites com os cofres paulistanos. Se isso é desgoverno, omissão ou ato de improbidade, não me cabe o julgamento, mas posso afirmar que o excesso de burocracia, que tem por objetivo a arrecadação de taxas, está levando esta caótica cidade... para onde?

Como paulistano, sinto-me sitiado pela violência, não só aquela dos assaltos e seqüestros, mas também aquela que é praticada por cidadãos contra cidadãos, naquilo que poderia complementar o pensamento do Prof. Alberto Oliva em “Existe Amor Social?”, publicado no Jornal da Tarde de 12 de Janeiro de 2003, de que a falta de amor social seria resultado de um tipo de resistência contra a dominação política ou ideológica.

A mídia, autonomeada como “a voz do cidadão”, só faz cobrar e culpar as autoridades: do calo do pé à enchente de toda a cidade, a culpa é sempre da autoridade omissa e perdulária, induzindo-nos a esquecer de que sobre as águas, bóiam toneladas de lixo jogado pelas próprias vítimas das enchentes. Tem também aquela dondoca que acaba de chegar da Europa e convida uma amiga para irem ao shopping. A caminho, no interior do blindado, falam de “como o brasileiro é um povo atrasado”. Mas o que a nossa recém-civilizada se esquece, é de reparar que ela, distraída, acaba de “queimar” a faixa de pedestres.

No Brasil, temos a falsa idéia que a “cidadania” depende de Lei, de CIC e de RG. Tanto é assim que nossos idosos são brutalmente discriminados com um carimbo vermelho em suas carteiras de identidade para provarem que são idosos. Experimente um idoso rebelde, desses que se recusa a ser discriminado, tomar um ônibus na cidade de São Paulo, pagando o alto preço da tarifa. Ele não consegue sequer o embarque no “coletivo”, pois o motorista, ao avistar a cabeleira branca, simplesmente não pára no ponto. Ai de mim que sou grisalho.

O ECA, o famigerado Estatuto da Criança e do Adolescente, diz que “a responsabilidade sobre a criança é da Família, da Sociedade e do Estado”, e ao invés de cumprirmos a Lei, clamamos que ela seja modificada, se possível, com a inversão das responsabilidades citadas, apenas porque a responsabilidade penal não é condizente com o nível de responsabilidade social da cidade.

Ao transformar a solidariedade em ação direta de governo, o PT e seus eleitos clamam pelo apoio da Sociedade. Só não enxergam (será mesmo?) é que transformarão a guerra contra a fome em luta de classes, aumentando ainda mais a distância entre o cidadão e suas instituições. E criar-se-ão Leis, Estatutos e Cadastros, e o esfomeado será carimbado, qual um idoso, mediante o pagamento de uma módica taxa de custeio, obviamente. E o Esfomeado que não tomar três refeições por dia estará sujeito à pena de um a seis meses de reclusão, e multa, mesmo que esteja de dieta.

Até mesmo um negro retinto necessita se dirigir a um órgão público qualquer e declarar: “sou um Negro!”, e daí em diante fazer jus aos seus “direitos de cidadão discriminado” e, quem sabe, conseguir emprego em alguma daquelas empresas que estão obrigadas a separar vagas só para negros.

É nisso aí que nos transformamos, e por isso mesmo merecemos os governos que temos.


12.1.03

Superlotação de desaparecidos*

Nota do Editor - Apesar da reportagem abordada abaixo pelos autores do texto ter sido publicada no dia 20 do mês passado, sua crítica não perde a força com o passar dos dias. Trata-se de mais um exemplo da fome por notícias contra o regime militar que abundam em nossa imprensa. O problema, alías, não está na crítica, diga-se de passsagem. Está na publicação de inverdades, de notícias produzidas sem a devida checagem e pesquisa. Assim é covardia.

O Correio Braziliense, de 20/12/02, publicou em seu caderno Coisas da Vida, na página 02, que pesquisadores brasileiros e ingleses começarão a examinar os “corpos de 1200 desaparecidos durante a ditadura militar” que estão sepultados no cemitério de Perus. Segundo, ainda, o Correio Braziliense, no início dos anos 90 o cemitério clandestino de Perus foi descoberto nos arredores de São Paulo.

O Grupo Tortura Nunca Mais diz que são 184 os mortos e 136 os desaparecidos na “luta contra a ditadura”. Desses 136 desaparecidos, 53 teriam sido durante a guerrilha do Araguaia, em plena floresta amazônica. Portanto, restariam 83 corpos de desaparecidos para o restante do Brasil, inclusive para o cemitério de Perus que, por sinal, nunca foi clandestino.

A mídia transformou 83 desaparecidos em 1200, “sepultados clandestinamente”, segundo ela, no cemitério de Perus. Absurdos iguais a estes são publicados, periodicamente, pela imprensa, talvez para que o povo nunca esqueça dos “milhares de desaparecidos” criados pela mídia.

Quando Luiza Erundina era prefeita de São Paulo, ela iniciou a campanha para encontrar os “desaparecidos da ditadura no cemitério clandestino de Perus”. Os jornais da época noticiavam, em primeira página, e as TV em seus noticiários, o encontro de milhares de ossadas de desaparecidos e mostravam ossadas e mais ossadas sendo desenterradas para serem entregues aos legistas da UNICAMP, que iriam identificá-las.

Ninguém foi identificado, mas os desmentidos nunca foram feitos. À opinião pública resta a crença de que em Perus existem mais de 1200 ossadas de desaparecidos, o que a recente publicação do Correio Braziliense pretende reforçar. A mídia, porém, nunca se preocupou em dizer é que o famoso “cemitério clandestino” não passava de valas comuns, onde eram enterrados os indigentes e, também, os corpos daqueles para quem as famílias não renovaram o aluguel das covas ou jazigos onde estavam sepultados. Essas ossadas, na realidade, são muitas e com o acúmulo dos anos devem ter chegado aos milhares.

Lá, nesse cemitério, podem até ser encontradas ossadas de terroristas que morreram em combate e que portavam documentos aparentemente verdadeiros, conseguidos por meio de certidões de nascimento falsificadas. Verdadeiros, no entanto, porque foram fornecidos, legalmente, por um serviço de identificação a partir das certidões “verdadeiras” obtidas em cartório por meios ilícitos.

Assim, o terrorista morto em combate era enterrado como indigente e com o nome e identidade que portava no momento do óbito. Tudo feito às claras, devidamente registrado no cemitério e no inquérito policial que apurava o caso. Basta procurar nos arquivos do Superior Tribunal Militar para confirmar.

O cemitério de Perus tem sido palco de missa “politicamente piedosa”, celebrada por D. Paulo Evaristo Arns, por abrigar “milhares de ossadas das vítimas da repressão”, como alardeavam, histericamente e sem nenhuma comprovação, os “Procuradores de Ossos”.

Agora, voltam novamente a remexer nos restos mortais destes infelizes indigentes que, se em vida não encontraram ventura, após a morte tiveram negado o descanso cristão. O destino desses despojos, porém, até hoje é negado à opinião pública, a quem só coube o alarido político e as discutíveis demonstrações de religiosidade.

Onde estão, afinal, as ossadas irresponsavelmente retiradas das valas da indigência? As almas desses desafortunados teriam missas “piedosamente” celebradas em sua intenção, se não estivessem, talvez, misturadas com alguns dos 136 terroristas que, segundo o Grupo Tortura Nunca Mais, teriam desaparecido em todo o Brasil?

Alvo preferencial da funérea bonomia de D. Paulo, o cemitério de Perus, no último dia de finados, não teve novamente a sua paz importunada pelo “desvelo da Igreja engajada”.



*Produzido por Ternuma (www.ternuma.com.br)

11.1.03

Além da bolsa

Por Omar Nasser, de Curitiba

A quase unanimidade dos analistas exulta com o que consideram as primeiras vitórias do governo Lula no campo econômico: bolsas em alta - salvo períodos curtos de recuo em função da realização de lucros -, dólar em queda - salvo "repiques" em função do crescimento esporádico da demanda por parte daqueles que buscam dólar "barato" para saldar dívidas - e inflação na descendente.

O otimismo que brota com as notícias da área econômica contamina as análises políticas. Lula é alvo de loas pelo "acerto" na escolha dos nomes que compõem o 1º e 2º escalões da administração federal. A calma dos mercados é tomada como medida do sucesso "inconteste" do novo governo.

A onda passa das páginas dos jornais e dos editoriais televisivos para o seio da opinião pública. Parece que, realmente, os receios e desconfianças do período eleitoral não tinham justificativa. Aqueles que viam com insegurança o triunfo lulista têm, agora, a imparcialidade dos dados econômicos a contestar-lhes os temores e a retirar-lhes a razão. "A esperança venceu o medo", discursou, confiante, o novo presidente.

Pois é precisamente nesta ênfase aos números da economia que deve residir a desconfiança. Concentrar a atenção da opinião pública neste foco significa desviá-la de outros, fundamentais para o entendimento do que vai pelas terras tupiniquins nestes tempos de rubra euforia. E do que o futuro pode nos reservar.

A eleição de Lula representa a realização prática de um projeto de poder que há quase 70 anos vem tentanto realizar-se no País. Abortado em 1935 pela reação varguista, em 64 pela Revolução e nos anos seguintes pela feroz resistência empreendida pelo regime às tentativas de revolta comunista armada no campo e nas cidades, a esquerda assume, finalmente, o comando do Estado, pela "via democrática".

O que ocorreu em outubro último foi o coroamento de um lento processo de construção da hegemonia esquerdista no País. Perdidas as batalhas no campo militar, a tática adotada foi a de, espertamente, retirar-se da cena bélica, transferindo-se para os bastidores da vida civil. O teatro de guerra deixou de ser ruas e matas escondidas do Interior do País. Passou a ser as escolas, universidades, o meio editorial, as artes, a Igreja.

À medida em que Lenin e Che Guevara perdiam espaço e Gramcsi crescia em importância no meio intelectual esquerdista, espandia-se a chance de sucesso do projeto socialista no Brasil. Projeto este que não se esgota agora, com a ascensão de Lula. Pelo contrário. Ele se fortalece mais que nunca, pois dispõe, agora, do aparelho de Estado para se consolidar. As teses da esquerda, antes transmitidas e debatidas à socapa nas salas de aula dos cursos secundários e universidades, nas apresentações teatrais e debates televisivos, nos grupos de jovens e associações de bairro, aparecem, agora, com toda a sua clareza, assumindo a condição oficial de programa de governo, respaldadas pelo poder constituído. E constituinte, pois a aliança que elegeu Lula e que com ele governa - PPS, PDT, PSB, a esquerda do PMDB e o PCdoB - dispõe de instrumentos preciosos de exercício efetivo de poder, como as medidas provisórias.

O que vai determinar nosso futuro como nação democrática não são, unicamente, a cotação do dólar e a impressão da comunidade financeira internacional sobre o presidente eleito. São as ações do governo federal nas esferas educacional, cultural, e os seus projetos voltados para a área de segurança pública, em especial no que toca às condições operacionais das Forças Armadas. (A estas, a julgar pelas primeiras informações divulgadas pelo Palácio do Planalto, após o sucateamento a que foram relegadas durante os anos FHC, restará o papel de construtoras de pontes e distribuidoras de cestas básicas. Assunto para outro texto).

Enquanto a população continuar com os olhos e ouvidos voltados apenas para as cifras do mercado financeiro, estará deixando de perceber que algo de muito grave está acontecendo no País. A China continental cresce a surpreendentes 8% ao ano e os seus capitalistas são cada vez mais numerosos e ricos. No entanto, tente-se criticar o governo chinês ou praticar livremente uma religião.

Os jovens da Praça de Tian Anmen e os muçulmanos do Sinkiang têm larga - e amarga - experiência de vida numa nação em que a economia vai muito bem, obrigado, mas as liberdades individuais padecem. Foram relegadas pelo Estado Comunista à condição de veleidades pequeno-burguesas.

10.1.03

Em nome da Fome

Maria Lucia Victor Barbosa

Os que acabaram de assumir o comando da Nação gozaram de uma situação sui generis, a transição, que poderia ter sido um período de precioso aprendizado, de recebimento de informações privilegiadas para que a estréia não fosse tão amadora. É verdade que foi um tempo curto, mas nenhuma outra equipe governamental usufruiu dele, nem por isso se comportando da maneira como no momento acontece. Da bomba atômica aos militares construindo estradas e muito mais coisas estranhas, a sensação que se tem é de se estar vivendo um festival de despreparo e desencontros, enquanto no Congresso a compra e venda de interesses, o dar e receber, o comércio dos cargos nunca foi tão exacerbado.

Tudo é feito em nome da fome e ocorre-me que em nome da fé ou de certas ideologias de teor aparentemente humanitário, foram postas em prática ações nada bonitas de se ver e situações nada agradáveis de se viver.

Durante a campanha, o atual presidente prometeu que todos os brasileiros pobres teriam três refeições diárias. Meritória e comovente idéia que muito emocionou o eleitorado e funcionou como magistral engenharia de marketing, fixada no objetivo de angariar votos. De acordo com esse intento, trabalhou na transição um considerável grupo de petistas, tendo sido montado o Programa Fome Zero sob a coordenação do agora ministro do Combate à Fome e Segurança Alimentar, senhor José Graziano.

Sob a égide do ministério de nome tão impressionante, abrigou-se mais uma vez a esperança de que o aguilhão da miséria desaparecesse do solo pátrio. Afinal, a pobreza, continua ser um dos grandes dilemas brasileiros. Sob seu peso podemos sucumbir, pois a pobreza significa a degradação não apenas de quem é pobre, mas da nação que comporta esse fenômeno, acentuado ainda mais no contraste entre ricos e pobres. Entretanto, não se mitigará esse mal social usando-se de artifícios assistencialistas, próprios do populismo. Esses métodos paliativos apenas servem para manter os pobres sempre pobres e dependentes do pai Estado e é isso, infelizmente, que se descortina no traçado do Programa Fome Zero. Aliás, a inconsistência do Programa é tanta, que seus responsáveis não sabem nem como nem quando ativá-lo, apesar dos bilhões de reais e dólares à disposição e da boa vontade expressa na generosidade dos donativos.

Em nome da fome exagera-se o número de famintos, que na campanha eleitoral foram confundidos com pobres e inflacionados para 54 milhões, passando-se aos eleitores uma imagem de Biáfra e não de Brasil.

Em nome da fome nosso espaço aéreo ficará vulnerável, pois o governo resolveu suspender a compra dos 12 caças que iriam substituir os 18 Mirage, alguns já sem condição de voar. Entretanto, conforme editorial do O Estado de S. Paulo (07/1/03), este foi um ato demagógico na medida em que, "nem um centavo sequer dos US$ 760 milhões destinados ao Projeto FX aplacará a fome de qualquer brasileiro, pelo simples motivo de que esse dinheiro não está no Orçamento e muito menos nos cofres do Tesouro Nacional. Na verdade o dinheiro não existe".

Em nome da fome o presidente se deslocará com 30 dos seus ministros e 8 secretários com status de ministros, para ver, entre um banquete e outro, como passam fome as populações mais pobres do Nordeste. Mas o custo de tal comitiva certamente daria para alimentar pelo menos por uns três meses os habitantes da miserável Guaribas, onde Lula não vai mais. Com todo respeito, gostaria de observar ao Sr. presidente, que a campanha já acabou e que essas caravanas eleitorais não surtem mais efeito, uma vez que os votos já foram conquistados. Assim, seria mais econômico se ele visitasse as 50 famílias de miseráveis que vivem a 2 km de seu gabinete no Palácio da Alvorada. Daria na mesma e o presidente que prometeu mudança seria do mesmo modo abraçado, beijado e poderia distribuir autógrafos.

Em nome da fome, porém, o que se necessita é a geração de mais oportunidades de trabalho e de melhores condições de saúde e educação. Só assim se pode restaurar a dignidade de um povo e se construir o futuro de uma Nação. O resto é populismo, essa praga social que viceja abundantemente na América Latina. Aí estão Cuba e Venezuela como exemplos mais gritantes que não me deixam mentir.

*Maria Lucia Victor Barbosa é socióloga, escritora e professora universitária.


7.1.03

O jornalista-avestruz da era petista*

Por Sandro Guidalli

No último artigo de 2002, comentei nesta coluna sobre o surgimento de uma ampla e vigorosa mídia chapa-branca, nascida a reboque da ascensão do petismo. Na verdade, o PT sempre contou com a simpatia ou a militância dos jornalistas do país inteiro e pode-se contar em segundos os que não fazem parte do cordão de aliados do partido dentro das grandes redações.

A diferença agora é que os petistas não são mais oposição na esfera federal, o que transforma sua robusta rede de apoio na imprensa em uma gigante mídia chapa-branca. Para quem não sabe, é chamado de jornalista chapa-branca todo o profissional das comunicações empenhado em defender, bajular ou beneficiar os detentores do poder fingindo-se de míope diante dos erros, problemas ou falcatruas naturais em qualquer administração.

Pois em apenas uma semana de governo Lula, já foi possível observar a dimensão do “chapa-branquismo” petista. São vários casos cuja descrição aqui é inviável mas que podem ser resumidos com alguns exemplos. O principal deles diz respeito à política internacional do PT e de como a imprensa vem tratando o assunto.

Lembram-se os leitores de que ao longo da campanha eleitoral, a grande mídia ignorou (ou debochou) a existência do Foro de São Paulo, bem como as críticas ao alinhamento político do PT às Farc, Chávez e Fidel Castro. Para quem não se recorda, o Foro é um organismo co-fundado pelo PT e que congrega todas as forças comunistas e totalitárias da América Latina. Fazem parte dele desde terroristas marxistas até grêmios esquerdistas menos radicais, passando é claro pelo guru de todos, o ditador cubano.

A postura dos jornalistas foi similar então ao salamaleque daquelas exóticas aves que se enfurnam num buraco na terra e fingem perder de vista a realidade. Acontece que bastou chegar o dia da posse para que a informação omitida durante meses viesse à tona para ser tratada com a mais envernizada cara-de-pau pela mesma imprensa que a fingiu ignorar.

Fidel Castro e Hugo Chávez, além da presença de 18 membros das Farc, não só foram as principais estrelas do show da posse como, no caso dos primeiros, foram recebidos em café da manhã e jantar, distinção feita pelo PT que apenas prova o relacionamento fiel e íntimo entre o novo governo e seus aliados no Foro de São Paulo.

Da mesma forma como fez de conta que o PT nada tinha a ver com a esquerda revolucionária das Américas, para não estragar a farsa do “novo PT” e do “Lula Paz e Amor”, a imprensa entrou o ano dando uma de ema, tapando os olhos para as revelações* sobre o financiamento da Al Qaeda pelo governo de Hugo Chávez, o mesmo que luta para amordaçar a imprensa de seu país mas que aqui, entre os jornalistas locais, é tratado com farta generosidade.

Há outros exemplos, menores, contudo, emblemáticos da nova mídia chapa-branca. Uma conhecida colunista política de O Globo, chapa-branca de longa data, tratou como absolutamente normal a informação de que o governo Lula pretende dar exemplar destaque aos programas sociais, torrando dinheiro em campanhas de divulgação. Afinal, segundo ela sublinhou, o povo precisa saber o sentido do Fome Zero e precisa se engajar na luta contra o analfabetismo, por exemplo.

Acredite o leitor a que ponto promete chegar o jornalista-avestruz da era petista. Lembro-me perfeitamente de que já li críticas e mais críticas na mídia sobre o gasto do poder público, estadual, municipal ou federal com propaganda. São centenas os jornalistas neste país que já denunciaram o uso de verbas estatais na autopromoção de suas ações administrativas ou sociais. Mas no caso do governo Lula, já temos um aperitivo da nova postura da imprensa diante de vícios que, afinal, ela própria cansou de recriminar em artigos, textos ou reportagens no passado.

Mas esta postura benevolente com o PT, imagino eu, trará mais prejuízos que beneficíos aos jornalistas. É que ela está relacionada ao declínio da credibilidade de editores e repórteres que colocam a paixão política acima da verdade dos fatos. Espero que nem tudo esteja perdido em quatro anos.

Texto escrito para o portal Comunique-se

6.1.03

CubDest: 5o. aniversário

No Natal de 2002, a agência de notícias CubDest / Desde o Desterro completou seu 5º ano de atuação na Internet. CubDest começou suas atividades com a difusão de notícias e comentários sobre a realidade cubana, em favor da liberdade de 12 milhões de irmãos que gemem na ilha-cárcere, a outrora "pérola das Antilhas". Em seguida foi expandindo seu raio de ação informativa e suas análises em países das Américas, Europa e Ásia, onde a liberdade está em jogo. Seu web site http://www.cubdest.org transformou-se em um ponto de referência indispensável para conhecer aspectos medulares da situação político-religiosa internacional.

Em 2002, acontecimentos importantes no Brasil, Colômbia e Venezuela tiveram destaque especial por parte da agência CubDest. Também, pela primeira vez, colaborou-se efetivamente em uma campanha relacionada à Rússia, especificamente, alertando sobre a perseguição que sofrem os católicos em tal país, atendendo ao pedido público feito pelo Arcebispo de Moscou, Monsenhor Tadeusz Kondrusiewicz. Eventos internacionais como o 2º Foro Social Mundial, em Porto Alegre e o 58º período de sessões da Comissão de Direitos Humanos da ONU, em Genebra, foram objeto de particular atenção. Casos humanitários, como o do jovem cubano Oriel de Armas e família, ameaçados de expulsão da Itália, onde solicitaram asilo político; do físico cubano Dr. Juan López Linares, residente em Campinas, Brasil, que pleiteia o direito de ir à Cuba para conhecer seu filhinho Juan Paolo; e do preso político cubano cego, Dr. Juan Carlos González Leiva, cuja vida corre sério risco, também foram objeto de ampla difusão.

Hoje, a agência CubDest conta entre seus subscritores autoridades civis e eclesiásticas, jornalistas, formadores de opinião, universitários, dirigentes de organizações não governamentais da área de direitos humanos, etc., em dezenas de países, com o qual alertas noticiosos ao mundo inteiro, em diversos idiomas, são dados em questão de minutos.

CubDest não se identifica necessariamente com todas as opiniões vertidas em notícias e artigos que não são de seus colaboradores diretos, porém, os dá a conhecer por considerar que seu conteúdo é de importância para a causa da liberdade.

Para ver o Catálogo de Publicações Janeiro-Dezembro de 2002, com os respectivos links, o leitor deverá fazer clic em http://www.cubdest.org/ccatal/cindi02.html

Para ter acesso à web page com os Catálogos de Publicações 1998-2002, divididos por ano, basta fazer clic em http://www.cubdest.org/indcatal.html

Agradecemos especialmente o apoio recebido por tantos de nossos amigos, simpatizantes e correspondentes em mais de 60 países nos 5 continentes. Que a Divina Providência os recompense com o cêntuplo nesta terra e lhes conceda abundantemente a Fé e a Fortaleza, virtudes tão necessárias para continuar enfrentando publicitariamente ao longo de 2003, os adversários da civilização cristã.

Agradecemos, por fim, a deferência de centenas de milhares de pessoas que têm visitado nosso web site, ao longo dos últimos 5 anos.

Tradução: Graça Salgueiro